O ócio que nos move


O sonho americano, da promessa ao resvalar moral. Seres à margem, alvos do mesmo julgamento que colocara as personagens de Tangerine na beira do prato. The Florida Project abandona um pouco a aura caseira do filme anterior de Sean Baker, popularmente conhecido por ter sido filmado com iPhone 5S, mas mantém uns certos laivos de documental que se acerca das "minorias". Visualmente mantém a palete caleidoscópica, não deixando nunca de parecer inato ao mundo em que se insere. Ambos se apresentam conscientes da contemporaneidade - as selfies no momento da desgraça, na ânsia do registo - sem incorrer no erro do expositivo da grande maioria dos filmes que desesperam em mostrar-se actuais e compreensivos da era virtual.

A força motriz de The Florida Project são as crianças, opção criativa que aqui funciona muitíssimo bem mas que tantas outras vezes se vê tiro ao lado pela escolha do elenco. São estas que pegam no espectador pela mão e o levam a explorar o espaço. A imaginação que lhes metamorfoseia o mais mundano dos objectos, ocasional escape à realidade. Há tempo e espaço para as deixar brincar, ser, protagonizar uma narrativa que continuamente deixa de enquadrar os adultos. A química está toda presente, seja essa entre o elenco infantil, seja entre as crianças e os demais que os educam/influenciam. Elos que primam pelo genuíno, fazendo do mais recente filme de Sean Baker companhia ideal a American Honey, outro que se viu resposta perante a decepção do sonho americano. A liberdade nos movimentos, no estar, no ocupar do espaço e inerente contemplar. Um quê de genuíno que vem da inexperiência das actrizes, ainda livres dos artíficios acertados do representar como profissão.

Filme menor quando equiparado à frescura e urgência de Tangerine, mas que não deixa de ser uma magnética fatia de vida. 

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